O que falar sobre Carol, moça que mal sei quem é, mas já considero pacas? Como não me identificar com ela, que estava apenas tentando fazer seu trabalho e não pôde?
“Ah, mas foi só um elogio” diz a pessoa machista. Veja bem, vamos esclarecer umas coisas: a entrevista com Vin Diesel na Comic Con Experience era um momento de trabalho. Por mais descontraído que fosse o local, ainda era um ambiente de trabalho. Ela, a repórter, e ele, o entrevistado. Imagine você numa reunião com seu chefe, os dois de terno, e de repente ele para o que está falando pra dizer que você é bonita(o). Inaceitável, certo? Estranho, creepy, medonho, e tantos outros adjetivos.
Se é bizarro em um escritório numa reunião, por que achar que é aceitável em uma entrevista?
Mais uma coisa pra entender: Vin Diesel ali era muito mais importante que a moça Carol. Moça Carol é uma youtuber, Vin é um ator famoso de Hollywood. Se ela se irritasse ou se defendesse do assédio de forma agressiva, quem ficaria sem emprego? Adivinha. Se a pessoa no escritório é rude com o chefe porque ele está flertando com ela no meio de uma reunião, adivinha quem corre o risco de ficar sem emprego? A situação é a mesma.
Essa não é a primeira vez que algo do tipo acontece e o mundo resolve tapar o sol com a peneira. Quando Amber Heard acusou o então marido, Johnny Depp, de tê-la agredido, milhões de fãs foram a sua defesa, alegando que ela estava mentindo, era interesseira, queria o dinheiro dele, a fama etc., etc., etc. Quando ela recebeu o dinheiro do divórcio, o que ela fez com ele? Doou pra caridade. E a carreira? Vai mal. Já a de Johnny, até J.K. Rowling o apoia, mesmo com esse passado que o condena.
E não só no exterior que acontece essa maravilha toda, aqui também. Lembram-se de um cara chamado Biel? Pois é. Assediou a repórter, que prontamente o denunciou e mais prontamente ainda perdeu o emprego.
Isso é o que normalmente acontece no mundo, queridos e queridas, o homem assedia, a mulher perde o emprego, a carreira, a reputação, é chamada de mentirosa, interesseira e muito mais, enquanto eles são os pobres inocentes. Precisamos parar de repetir esse padrão. Precisamos parar de achar que uma mulher que se sente desconfortável com uma atitude de um homem ou o denuncia por assédio é uma mentirosa interesseira.
Pense bem: por que alguém arriscaria sua carreira, que levou anos pra construir, sua reputação, que ela se esforça pra manter, enfim, tudo, só pra falar mal de um cara? Pra quê?
Se você já está com o dedinho coçando pra me xingar nos comentários ou começar a justificar a atitude do Vin, do Johnny ou do Biel, coloque-se na situação dessas mulheres. Muito distante pra você? Ok, imagine que sua irmã estava ali. Sua namorada. Sua mãe. Alguma mulher que significa muito pra você.
Imagine essa mulher passando anos estudando e trabalhando, depois dias e dias pesquisando, gastando horas e mais horas do dia com anotações, para chegar naquela entrevista e conseguir o máximo de informações possíveis sobre o novo filme de Vin Diesel, para agradar os fãs do ator.
Imagine todo esse trabalho, anos de dedicação, indo pra lata do lixo porque ele resolveu não responder as perguntas pra insistir em canta-la e ela, desconfortável, comentou online que não gostou da atitude dele.
Anos de trabalho questionados por conta de uma única entrevista. Ela que “não soube aceitar elogio”. Elogio tem hora e lugar. Enquanto estamos trabalhando não é a hora. Isso é assédio. Além de tudo, foi um desrespeito aos fãs, que não tiveram as respostas que queriam porque o ator achou mais importante tentar pegar a garota brasileira.
Ela não estava ali pra servir de quadro pra ser admirada e ele não estava ali pra convida-la pra jantar. Carol estava ali como repórter, cumprindo seu papel de reportar notícias de um lado para o outro, do ator para o fã. Ela fez a parte dela. Quem não fez o trabalho direito ali foi ele.
E antes de me xingar ou ofender a Carol, reflita. Empatia é de graça e não faz mal a ninguém.